quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Festas e Pessoas Inumanas



Nada era novo para ela. Todos aqueles rostos, mesmo que pertencessem a pessoas novas, eram idênticos a todos os outros que já vira. E a música, pulsante, controladora, contínua, também não modificara. Ela marchou através da pista de dança, sufocada, desviando-se de esbarrões. Apenas uma pergunta pairava em sua mente:
O que estou fazendo aqui?
Para que, exatamente, servia aquele vestido curto de tecido caro, que brilhava sob as luzes coloridas? Por que, desprovidamente de sentido, ela bebia um drinque atrás do outro como se quisesse afogar-se neles?
A jovem não fazia ideia de nada disso.
A pista de dança revogou e ela chegou até a sacada do clube noturno. Seus amigos estavam provavelmente dançando, sem dar-se falta dela, preocupados de mais em agarrar-se com alguém no banheiro.
Seus pés doíam. Seu cabelo estava suado. Sua visão girava levemente por causa do álcool.
Apoiou-se no parapeito, olhando o enorme jardim que estendia-se à sua frente como um horizonte finito. A madrugada era friorenta, nebulosa, porém estrelada.
- O que estou fazendo aqui? – murmurou para si mesma, desejando que falar em voz alta a ajudasse a descobrir a resposta. Não, nada ajudaria. Não existia resposta para tal pergunta.
Olhou para trás, por sobre os ombros descobertos, e viu novamente todos aqueles corpos dançando, agarrados, suados, falsamente felizes e completamente perdidos em seus próprios mundos fechados.
Escuros. Aqueles mundos eram tão escuros, tão bem chaveados que ninguém poderia sair.
Desviou o olhar. Aquela festa só a deixava triste, e precisava afastar-se. Caminhou até a escada que descia até o gramado do jardim, deixando o clube sustentado por toras de madeiras para trás.
À medida que andava, os sons da sociedade diminuíam, aliviando seus ouvidos. As árvores pequenas e bem cortadas vigiavam-na de perto, fazendo-lhe companhia. Ela sentiu aspiração de ser uma árvore, de não precisar pensar, de não precisar viver a vida turbulenta de um humano. Por que ser uma humana, uma jovem, um ser cheio de emoções ridículas e pensamentos recicláveis era um inferno, contudo, ser uma árvore, uma planta, parecia tão simples e inútil que era quase aliviante olhá-las, tocar em suas folhas imóveis.
A garota continuou a andar pelo caminho mal iluminado, afastando-se cada vez mais da música agitada, de uma batida que lembrava uma estaca psicodélica sendo socada contra a cabeça ensangüentada de um idoso. Bom, não exatamente assim, mas essa fora a imagem que lhe viera à mente: A de um idoso sangrento. Ela quase riu. Quase. Por que riria, afinal? Riria por que aquilo fora engraçado? Riria por que era sarcástica de mais para admitir o fato de que nada naquela porcaria toda tinha alguma graça real? Riria por que na verdade estava morta, por que estava em coma, por que tudo aquilo era um sonho?
Não, ela não riria, por que aquilo era sua vida.
Aquilo. Por que logo aquilo?
Seu reflexo no espelho, logo antes no banheiro lotado, era ela mesma. A mesma de sempre, um sempre que não possuía nem começo nem fim, muito menos um presente, porém que ela era obrigada a viver e viver e viver infinitamente, sem um minuto de descanso, sem um minuto sem pensar. Deus, por que a obrigavam a pensar continuamente? Seriam os superiores deuses ou astros tão cruéis a ponto de dar-lhe uma mente pensante e fazê-la com que pense sobre tudo, todo o tempo, lastimando-se sem direção e sem saber o que fazer naquele lugar.
Por que ela sempre soube que aquele não era seu lugar.

Um comentário: