sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

A Sombra

Está escuro.
Não escuro por dentro, como sempre está, mas as vielas também mostram sua penumbra mediana. E sou a vidente que as observa com calma enquanto o resto de nós morre. As casas comuns são tomadas pelas ondas de sombras vivas como se fossem vinho em taças, e desaparecem ao comando de minha mente. As pessoas gritam. Elas não sabem quem eu sou. Não fazem ideia. Só o que vêem é a abissal sombra que as domina no alto do céu escuro, engolindo tudo o que existe nesse miserável lugar. Elas só vêem seus amigos e parentes desaparecendo no corpo da sombra, só vêem alguns pedaços de corpo caindo do alto como se chovesse.
Suspiro.
Meus olhos jazem fechados, concentrados no mundo exterior. Sorrio sadicamente, relembrando do rosto daquela pequena pétala de flor que um dia sorrira para mim em um inverno de 1940, quando ainda éramos felizes. Mas eu a matara, e fora tão gracioso.
Mais gritos. A sombra que tomava o céu e a cidade aumentava, crescia a cada morte, a cada dor. A cada choro de agonia.
E eu admirava, controlando a enorme onda bruna, os pequenos corpos humanos correndo pelas vielas e alamêdas como pequeninas formigas que tentam inutilmente escapar de uma enorme mão monstruosa.

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